sexta-feira, 11 de outubro de 2013

OS GÊNIOS TAMBÉM AMAM



O que acontece quando duas almas grandiosamente sensíveis e possuidoras de genialidades diferentes ousam ligar-se uma à outra de uma forma absolutamente integral? Além de transformarem-se mutuamente, transformam o meio. E quando esse meio está às voltas de uma atividade artística, as explosões de ideias e de emoções emergem com toda sua fúria e frescor gerando frutos que cintilam e entram para a história da civilização como obras-primas.

Na Natureza, algumas paisagens são pintadas pela brutalidade a ferro e fogo por conta de tempestades, tufões, cataclismos, terremotos... e após essas devastações, algo surge trazendo a renovação de tudo. Um renascer mais vigoroso, mais sólido, mais maduro. Assim aconteceu por coincidência(?), quando duas almas se encontraram na Terra; se (re)conheceram e se entrelaçaram sem muito saber que já nasceram para completarem-se desde sua criação quando ainda transitavam no Invisível das coisas. Trouxeram consigo esse elo misterioso que nos dá medo quando uma emoção inexplicável transborda nos olhos, e que também nos faz temer, e mesmo diante das contradições, emerge a vontade de viver tudo intensamente como uma chama revoltosa e magnificamente viva que consome quem um dia soube realmente amar e ser amado por alguém.

Tanto o encantamento, quanto o medo do desconhecido, da vontade de fugir de se entregar a algo assim tão grandioso e assustador – a descoberta do Amor Verdadeiro em sua forma sublime, e também humana; em sua forma virginal... a Primavera da vida na sua fase em botão... quando o Amor revela-se para mentes brilhantes. Assim como o sentimento sublime une duas almas que se completam, assim também as poderia separar(?); como aconteceu na trajetória das vidas entrelaçadas entre os suecos Liv Ullmann (atriz) e o cineasta (e também escritor, dramaturgo, diretor e produtor de cinema) Ingmar Bergman.

Recordar é viver? Neste caso, para Liv lembrar-se de sua vida com Bergman, é transcender ao recorte do Tempo que tudo solda, resgata, confirma, costura e rasga por dentro recordações e sentimentos não mais revoltosos e apavorantes de solidões; incompreensões; ciúmes; abandono; superproteção; companheirismo, cumplicidade... restando para a atriz, apenas uma saudade amadurecida.

Numa conversa, quase confissão para si mesma, o documentário “LIV & INGMAR – UMA HISTÓRIA DE AMOR” (já disponível em DVD), sob delicada direção de Dheeraj Akolkar, conduz o espectador comum (e fãs da Sétima Arte), a um olhar oceânico sobre o que duas energias humanamente grandiosas, e contrárias até certo ponto, puderam tecer de bom para o mundo do Cinema, e também para seus desenvolvimentos pessoais e particulares enquanto Partículas Divinas em evolução na Terra.

Ele – um Canceriano mergulhado em seu mar de emoções, sensibilidades, possessividades, criatividade; um coração sensitivo – próprio aos nativos de Câncer, do Zodíaco – signo da Água perdido em suas correntezas regidas pela Lua, emotiva e imprevisível. Ela – um Sagitário, signo do Fogo, racional... que adora liberdade e expansão. Uma combinação improvável pelos Astros. Se juntos ficassem, seguiriam um consumindo implacavelmente o outro... mas, uma união e cumplicidade possíveis apenas pelas mãos, braços e pernas misteriosas do Amor. Assim foi. Aconteceram os conflitos esperados, até ambos encontrarem a Liberdade e equilíbrio necessários. Após cinco anos casados e com uma filha, registro sincero dessa união; Liv e Ingmar decidem dolorosamente viver suas vidas cada um, porém o inexplicável elo perdurou até que Bergman seguiu primeiro naquela Viagem inevitável para todos nós.

O documentário é bastante suave. Dheeraj Akolkar utiliza-se de recursos intrigantes para ilustrar as passagens de vidas em comum do casal, narradas por Liv Ullmann. Trechos de filmes encenados por ela e dirigidos pelo marido – depois apenas pelo então amigo Bergman, dão luz e voz à imaginação das palavras ditas pela atriz. Há também trechos lidos das cartas escritas pelo diretor sueco à sua ruiva musa, as quais revelam o lado doce e temperamental de Ingmar. Esse ponto me arrancou lágrimas de surpresa, emocionou- me muito... fiquei feliz em saber do cineasta uma coincidência que também acontece comigo: escrever cartas que segredam letras reveladoras de sentimentos. Às vezes escrever é melhor do que falar. A palavra silenciosa do papel pode traduzir mais os sentimentos densos, volumosos, às vezes não compreendidos pela força do impulso; que se acaso fossem ditas, não seriam palavras tão verdadeiras como as cumplices agarradas na caligrafia dum papel.

Outra passagem que também me fez chorar, foi no ponto do filme onde tão singelamente Liv partilha com o publico sua hesitação quando jovem, ao perceber-se apaixonada por Bergman. Ela (relatando bondosamente sua experiência de vida) me fez compreender o que eu própria sinto por alguém, e me deu a resposta. Por serem sensações nunca antes experimentadas, me causavam aflição na iminência de me arrancarem lágrimas. Estar apaixonada e vencida ao ser descoberta pelo Amor Verdadeiro de sua vida, realmente apavora, por causa do desconhecido que inevitavelmente irá consumar-se, indiferente à sua vontade ou não. O documentário “LIV & INGMAR – UMA HISTÓRIA DE AMOR”, além de trazer à Luz pequenas generosidades que a atriz Liv Ullmann oferece e que satisfazem aquele sentimento secreto de cumplicidade entre os amantes do Cinema com seus ídolos, é também uma fonte inspiradora para acreditar que sim, o Amor Verdadeiro (diferentemente do slogan da TIM...), realmente é sem fronteiras.


Katiuscia de Sá.
Escrito em: 10 e 11 de Outubro de 2013; às 03:23h.



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