Talvez eu esteja errada, mas o ultimo longa-metragem paraense
que estreou em Belém do Pará nos últimos anos foi na década de 1960,
precisamente em 1965. Este feito aconteceu pelas mãos do cineasta paulista (erradicado
no Pará), Líbero Luxardo. E de lá para cá, nada mais nesse sentido. É certo que
temos na terrinha bons, e até excelentes realizadores veteranos e jovens que insistem
arriscar-se num Set com suas corajosas equipes de filmagem, e há
resultados de média e curtas metragens (de ficção e documentários) de boa
qualidade, sem dúvida.
Entretanto, não é tarefa fácil, quando um longa vinga sem
recursos e patrocínios financeiros, como é o exemplo de A ILHA, do jovem
cineasta/ator Mateus Moura. Mas em se tratando de Cinema, quando o filme tem algo a
dizer, ele encontra qualquer caminho viável para tornar-se realidade. O
espectador mais atento conseguirá extrair desta produção, o nível cultural e de
comprometimento com a linguagem e história do Cinema, ao qual a equipe possui e
emprega na produção do filme. Posso até mesmo dizer que Mateus ousou em
manter-se firme e fiel à sua estética pessoal, o que eleva seu filme ao status
de obra artística.
Eu já havia acompanhando os trabalhos de cunho experimental deste
carioca de vinte e cinco anos que reside no Pará há dezesseis. E acredito, que
assim como o encanto que se abateu no veterano Líbero Luxardo, Mateus também tenha
sido mundiado pelas misteriosas energias
que regem essas terras caboclas, aguçando ainda mais sua criatividade.
A ILHA – longa-metragem (62 min. Digital. Cor. Brasil. 2013), conta
uma estória de ficção tendo seu argumento e direção assinados pelo jovem
cineasta, que se baseou nas lendas registradas na Ilha de Cotijuba (onde o
filme foi rodado). Esses rumores surgiram à época do educandário “Nogueira de
Faria” que abrigava menores infratores, mesmo local que no período da ditadura
Militar, tornou-se instalação para presos políticos, gerando horror e desespero
nos moradores locais, cuja angustia atravessou o tempo em forma das lendas nas
quais se inspirou o diretor.
O que me encantou neste trabalho de Mateus Moura foi
observar a maturidade do então jovem diretor em manter seu estilo (que já se
observa o embrião em seus curtas experimentais anteriores). Neste trabalho mais
elaborado d’A Ilha há sequencias despretensiosas como apenas um balançar de
folhas no meio do mato cercado pelos sons dos passarinhos; a fachada ao longe de um cemitério solitário e
entristecido pelo arrastar das ondas que se ouvem quebrar; o casal protagonista
imerso no seu universo cotidiano sem pressa, gerando no publico o estado psicológico
necessário para absorção daquela realidade natural e despreocupada que ronda os
moradores ribeirinhos.
Há quem dissesse, após o termino do filme, que achou desnecessárias
essas breves sequencias “paradas”, que aparentemente “não dizem nada”. Percebi a
destreza na montagem ao mostrar no longa esse tempo mais lento que vivem os
moradores ribeirinhos (que também sugere haver naquele local um mistério e
misticismo rondando). Tudo sem palavras, sem forçação de barra, utilizando tão
somente as imagens. Já havia notado – e gosto muito – esse tempo mais sutil, ao
qual Mateus se vale nos seus trabalhos em audiovisual; certamente proveniente
da educação de seu olhar pelos filmes asiáticos acrescido pelo seu gosto
literário pessoal.
Outro ponto a referir-se na montagem, é a utilização do
recurso da metalinguagem. O sobrenatural rondando a vida do casal, sugerida através
da obra de ficção ao qual eles assistem no DVD. Uma narrativa sutil e bem construída.
Agradei-me bastante também da fotografia do filme (sob a direção de Rodolfo
Mendonça) e do aproveitamento máximo da beleza natural das locações. A trilha
sonora contribuiu para esboçar o clima nostálgico parado no tempo, com as musicas
antigas e de sonorização acanhada de radinho; a paisagem sonora também erguida nos
momentos certos. Em alguns trechos cujo recurso de Slow Motion fora utilizado contribui de sobremaneira para fortalecer
o mistério que ronda o lugar além de acentuar a angustia e tristeza vivenciadas
pelos protagonistas, devido a recente perda. O abafado lamento expressado na
sequencia em silencio da ida do casal ao cemitério para o sepultamento onde são
levados pelo cavalo puxando a carroça que os transporta... sequência que aliás
(acredito) fazer leve homenagem ao filme “O Cavalo de Turim” (2011), de Béla
Tarr e também ao maravilhoso clássico “A Carruagem Fantasma” (1921), de Victor
Stöström; filmes que certamente somam na educação visual e de estilos do
diretor.
Outro ponto positivo a se mencionar, em minha opinião, são
as atuações das atrizes Rosilene Cordeiro e Carine Ramos; interpretações sem exageros
e com bastante verdade. Mas acredito que o ponto máximo dessa produção
independente que estreou na terça-feira ultima (15/10) no circuito alternativo
de Belém/PA, está em apresentar para a sociedade audiovisual paraense estes
jovens talentos do cinema que, se por acaso não têm patrocínio e/ou
credibilidade suficiente para conseguir apoio cultural qualquer que seja, metem
a cara para a realização de um longa metragem. A equipe acredita em si e fez parir
o filme A Ilha com a dignidade de quem realmente confia no seu trabalho.
Umas limitações, que acredito terem surgidas pelo recurso
independente da produção, foi a captação do áudio um tanto abafada que dificultou
um pouco a compreensão do discurso de abertura do filme; e outro fator (de meu
inteiro gosto pessoal mesmo) que me desagradou foram os Fades [Out e In] de
imagem, utilizados em demasia. Mas isso em nada embota a dignidade do primeiro
longa metragem de Mateus Moura assistido pela produtora paraense Maria Preta,
em parceria com a INSULAR produções, Coletivo de Cinema Quadro a Quadro, e Coletivo de Cinema Miritismo.
Vida longa ao Cinema Paraense!
Vida longa ao Cinema Paraense!
Hellen Katiuscia de Sá
16 de outubro de 2013, 17:16h.
*Veja o Trailer
Perfeito tudo o que penso e sinto sobre essa obra.Eu queria ter escrito tudo isso porque justamente pensei quase o mesmo. Vida longa ao Cinema Paraense MESMO!!!
ResponderExcluir=) legal.
ResponderExcluirTexto excelente!
ResponderExcluirObrigada Tiago. Texto totalmente motivado e inspirado pela minha admiração do filme de Mateus. Um artista inspirando o outro. Acho legal essa troca. Parabens a todos os envolvidos!!!!
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